No âmbito das “ FESTAS DA RÃ “ na Abóbada, S. Domingos de Rana, realizou-se um Colóquio sobre a temática do desemprego. Em que estiveram presentes cerca de quatro dezenas de pessoas interessadas.
A BASE-F.U.T., foi convidada para contribuir com uma intervenção e reflexão e participar no respetivo painel. Outras organizações também estiveram presentes como a Animar, através do professor Roque Amaro que expôs o papel da economia social e solidária e as suas perspetivas, propostas e ações que desenvolvem em prol do combate ao desemprego. Também o IEFP através do Dr. Miguel Lopes fez uma exposição sobre os apoios e iniciativas que o mesmo Instituto vem realizando e apoiando sobretudo os inscritos no fundo de desemprego.
Joao Lourenço, militante da BASE-FUT realizou uma intervenção sobre as causas do desemprego e como se podem desenvolver políticas de combate ao desemprego numa perspetiva de um novo modelo de desenvolvimento sustentável:
«A situação critica que se está a viver em Portugal em cada dia que passa invade-nos de profunda angústia, ela está presente no número de desempregados que cresce de uma forma assustadora ao mesmo tempo que não se vislumbra a proximidade de qualquer saída.
É fácil a análise conclusiva sobre o próximo ano em que poderemos atingir uma cifra astronómica pouco sustentável patente por vir a ultrapassar mais de um milhão e trezentos mil desempregados. Acresce o facto de haver um grande número de trabalhadores com vínculos instáveis e precários e ainda um outro grande número de trabalhadores empregados mas muito mal remunerados que não conseguem sair do limiar da pobreza. Esta é hoje a realidade com que nos confrontamos.
Um pouco de história, para compreendermos melhor o que estamos a passar. Foi com a I revolução industrial que nasceu os empregos coletivizados e produtivos, a chamada classe operária e então os emergentes empregados de serviços. Todos eram empregados por conta de outrem totalmente dependentes da sua aceitação e da sua capacidade de dar sempre mais - valia pela contrapartida da entrega e do seu saber e valor acrescentado em dedicação exclusiva ao trabalho e á empresa. Logo de seguida vieram os despedimentos sem justa causa e assim nasceu a necessidade de estes serem regulados, foi através da lei e isso exigiu a organização coletiva e societária e a negociação coletiva com os sindicatos. Foi esta realidade que ao longo dos tempos tornou sustentável as relações até então muito vulneráveis entre os trabalhadores, face ao poder da iniciativa privada e ao estado empregador.
A crise social atual está principalmente espelhada no desemprego, na exclusão e na pobreza. Parte do atual desemprego é estrutural não é um fenómeno como alguns afirmam, ele é o fruto do que vem detrás. Pois, na prática trata-se de desemprego quase natural nascido em boas condições económicas o mesmo não podemos dizer das financeiras que entraram em crise pela ganancia especulativa. Assim, esta crise está dentro de uma economia que funciona no seu potencial máximo, mas não corresponde em empregos devido ás mudanças estruturais e tecnológicas muito avançadas que estão a libertar o ser humano do trabalho, tal como este foi concebido no início da era industrial.
É por esta razão e pelas práticas políticas experimentadas nos últimos anos nas suas várias vertentes de organização e gestão que cresce o elevado número de desemprego. Este tem um carácter estrutural que nas últimas décadas mais que duplicou sentindo-se as graves consequências e o efeito devastador da sustentabilidade social e do direito ao trabalho, sem o qual não há dignidade nem realização plena de qualquer ser humano, seja como cidadão ou enquanto produtor, consumidor ou célula da sociedade.
Está posta em causa a situação do direito constitucional ao trabalho, pela dificuldade de se obter um emprego neste modelo de desenvolvimento que tem que ser corrigido e adaptado ás realidades presentes. É pelas apostas já demonstradas e sem saída das politicas até agora aplicadas que têm mantido os expoentes máximo do agravamento da situação trazida pelas injustiças estruturais que nos encontramos com este elevado número de desempregados ( com taxas na ordem dos 16% do desemprego geral, sendo ainda muito mais grave com os 36,6% de desemprego jovem e com uma levadíssima percentagem que ultrapassa os 44% nos de longa duração).
Como vamos viver sem trabalho?
Como sabemos o desenvolvimento é imparável e permite-nos produzir muitos mais bens e serviços com cada vez com menos intervenção de trabalho direto humano. Está aqui espelhada uma das razões da falta de pleno emprego e das afirmações contraditórias de políticos e empregadores “ que emprego para toda a vida já acabou”, então a vida também como nos iremos sustentar? claro que nisto há grande contradição pois apesar de constatarem uma causa não a combatendo antes pretendem dar-lhe folga com o aumentar do tempo de laboração quando deveria ser o contrário para haver mais possibilidades de mais empregos para quem não o tem. Como nos vamos realizar como seres humanos e como viver em cidades se não trabalharmos? É a pergunta que fica.
Claro que queremos políticas ativas de emprego mas não podemos esquecer a questão da produtividade de hoje que é o triplo daquela que existia nos anos de 1970. Também aumentámos no consumo é certo, mas infelizmente há matérias-primas não renováveis que já escasseiam e muitos casos em que a oferta de produtos fabricados está muito acima do que precisamos e conseguimos consumir.
O trabalho deixou de proteger os cidadãos e uma parte das pessoas da pobreza. É preciso que este volte ao seu papel anterior de contribuir para a realização das pessoas enquanto trabalhadores e cidadãos ativos com direitos constitucionais. Não é com propostas e práticas de abaixamento de salários, que só servem fazer baixar os custos do trabalho, que melhora a qualidade e se cria mais e dignifica o emprego.
Esta situação está a tornar-se explosiva porque não se vislumbram saídas, há mesmo uma grande falta de confiança nas populações por aqueles que nos governam através de medidas sem o nosso consentimento que nos empurram para pagarmos com austeridade um futuro que não será justo nem exequível porque se está a degradar a sustentabilidade sem equilíbrio e sem coesão social.
São precisas novas saídas
Sabemos coisas novas que até parecem contraditórias com aquilo a que nos habituámos a ver mas que efetivamente o não são. Comecemos pelos investimentos. Estes são bem -vindos mas nem todos efetivamente criam empregos, alguns até acabam com eles porque vêm imbuídos de novos métodos e tecnologias mais avançados que nos libertam do trabalho e da intervenção humana, ou ainda por novos setores que vêm substituir outros que rapidamente ficam ultrapassados. Caso presente e exemplar o que se passa na NOKIA Finlândia, que viu os seus telemóveis serem substituídos por smartfones produzidos por um número inferior de trabalhadores numa outra empresa, num outro local e noutro país.
Para tudo é preciso equacionar a sustentabilidade mesmo quando se fala em crescimento, porque não há crescimento sem limites como já podemos facilmente constatar, é só estar atento ao que se passa com o ambiente, temos que garantir a sobrevivência do planeta e encontrar soluções de acordo com a defesa das matérias- primas e do meio-ambiente. E isso obriga a reduzir muito certo tipo de consumismo e de produtivismo. Há quem nos apresente um outro crescimento, o financeiro em muitos casos até existe como nos países emergentes, mas este só por si não faz progredir o emprego á escala global como era necessário, pelo que é preciso repensar questões como o tempo de trabalho, reduzindo para 30 horas semanais ou menos, mais tempo para férias e lazer que criará mais postos de trabalho, garantir mais feriados, que aqui em Portugal nos foram retirados. Também reduzir os duplos e os triplos empregos sobretudo em algumas áreas socioprofissionais principalmente onde alastra o desemprego.
Com este desemprego estrutural é urgente reestruturar a economia com novos apoios para desenvolver novos empregos, devendo-se apostar mais na dinamização do sector da economia social, pois as sociedades capitalistas dentro desta globalização não mais voltarão a ser produtoras suficientes de empregos efetivos e sustentados, com o direito e a dignidade exigida no presente e no futuro próximo, garantindo a qualidade mínima necessária para uma verdadeira responsabilidade social que lhes cabe.
Quase todas as empresas descartam-se quando se fala em criar empregos e afirmam que isso é um problema do estado, mas os governos argumentam e dizem que isso cabe exclusivamente ás empresas e mesmo aos próprios trabalhadores. O estado não pode continuar a atirar este problema para cima dos seus concidadãos que não têm meios para sair desta chaga, o que a constituição obriga ao estado trata-se de um direito constitucional, nacional e humano abrangente de todos.
Inventar novas políticas
È urgente inventar novas políticas mais ousadas e avançadas, com novas ideologias, nova cultura e mais sensibilidade social que recrie um novo conceito de realização mais humanizada no trabalho através de novas empresas devidamente apoiadas que não se limitem nem obedeçam só à lógica do lucro mas na realização de empregos. Estas novas empresas poderão ser de âmbito do estado e da economia social para estarem sobretudo ao serviço dos cidadãos.
Para terminar, hoje o desenvolvimento económico e humano é imparável e permite-nos produzir cada vez mais bens e serviços com menos intervenção e trabalho, está aqui uma das razões da falta do pleno emprego mas não é razão para a falta de distribuição nem do crescimento da pobreza. É por isso que reconhecemos não terem razão as afirmações para quem não aprofunda a realidade e usa o chavão de que “ Emprego para toda a vida já acabou”. Aparentemente, poderá parecer certo mas então digam-nos: como nos vamos realizar e sobreviver nos lugares, nos campos e nas cidades?.
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