-Texto de apoio para um debate
alargado sobre a precariedade e suas consequências para os trabalhadores, suas
famílias e para a sociedade-
A estabilidade no trabalho – isto
é a existência de uma relação de trabalho de duração indefinida e regulada por
um um conjunto de direitos e garantias que protegem o trabalhador – não é um
dado natural das relações laborais. É antes uma conquista civilizacional pela
qual os trabalhadores e a suas organizações se tiveram de bater arduamente ao
longo de décadas. Mais ainda, a estabilidade no trabalho é uma conquista
incompleta e frágil. Incompleta, porque a estabilidade no trabalho nunca foi nem
é regra em vastas áreas do globo. Frágil, porque a estabilidade no trabalho
atenua seriamente um dos mecanismos fundamentais do capitalismo – a exploração
do trabalho – estando a sua manutenção sempre dependente da capacidade dos
trabalhadores e das suas organizações de forçarem a criação, melhoramento e
aplicação de quadros legais de proteção laboral e de sensibilizarem a sociedade
para a sua desejabilidade.
Nas últimas duas décadas, assistimos a um novo ciclo de precarização do trabalho – isto ao
crescimento do número de trabalhadores que não é ou é apenas parcialmente
abrangido pelos mecanismos de estabilização das relações laborais. As formas de
precarização do trabalho são diversas e surpreendem por vezes pela sua
criatividade – “falsos” recibos verdes, bolsas e estágios são apenas alguns dos
exemplos. Este ciclo de precarização não surge também ele por acaso. Antes
corresponde à implementação do projeto político e económico neo-liberal, para o
qual o agravamento do desequilíbrio de poder nas relações laborais é um
elemento central.
Precariedade e exploração do trabalho
Este desequilíbrio favorece fortemente a transferência de rendimentos do
trabalho para o capital, através da intensificação da exploração do trabalho –
seja através da compressão salarial, do aumento do horário e dos dias de
trabalho ou do estreitamento do intervalo de tempo correspondente a trabalho
suplementar. Ao mesmo tempo, intensifica a transferência do capital para o
trabalho dos riscos inerentes à atividade económica, através da facilitação dos
despedimentos e da redução das contribuições patronais para a segurança social.
Os efeitos sociais e económicos do recrudescimento da precariedade no
trabalho são profundos e fazem-se sentir em múltiplas áreas da vida individual
e coletiva. Os trabalhadores precários estão mais expostos a piores condições
de trabalho, auferem de salários mais baixos, beneficiam de menor proteção no
desemprego e na doença. Estão também sujeitos a carreiras contributivas mais
irregulares, afetando as pensões de reforma que receberão no futuro. A
precariedade também se constitui como um fator de discriminação no acesso ao
crédito para satisfação de necessidades básicas – em particular, a habitação –
e à compra de bens de consumo.
Uma sociedade com elevados níveis de precariedade no trabalho põe em causa à
sua própria reprodução. Ao reduzir a incapacidade de os trabalhadores
projectarem o seu futuro e ao favorecer o desequilíbrio entre a vida familair e
a vida profissional, a precaridade acarreta uma pressão sobre a natalidade. No
plano cívico, a precariedade promove o isolamento e o individualismo, dificultando
a ação coletiva e a participação cívica e assim enfraquecendo a vida democrática.
No plano económico, a subtração ao pagamento de contribuições põe em causa a
sustentabilidade da segurança social, que é em Portugal um mecanismo
fundamental de redistribuição de riqueza.
Texto elaborado por Pedro Estevão para o debate da Comissão para os Assuntos do Trabalho/CAT da Grande Lisboa.N0TA:Novos contributos são necessários, nomeadamente sobre as consequências da precariedade para a organização e ação sindical e para a saúde e segurança dos trabalhadores.
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