É claro que o futuro vai chegando, constrói-se a cada momento que dizemos presente! Sabemos, também, que não existe futuro desligado do passado e muito menos, pode ser perspetivado como a solução única e última, seja qual for a área da sociedade ou o tema sobre o qual procuramos abrir horizontes.
As formas de estruturação, de organização e de prestação do trabalho, "como tudo na vida", têm continuidades e descontinuidades, sofrem mudanças e transformações, e estão dependentes de vários fatores. São os contextos, os patamares de desenvolvimento das sociedades e as relações de força existentes em cada tempo, entre os atores sociais e políticos, que determinam as opções que se adotam e os fundamentos que as suportam.
O trabalho humano nem sempre foi dignificado, apesar de constituir uma dimensão essencial da economia e da sociedade. Numa sociedade que o dignifique, a determinação do lugar e do valor do trabalho implica que este seja considerado sinónimo de atividade transformadora, fator de criação de riqueza, dimensão ética e inclusive de prazer, fonte de produção de "obra" em múltiplos campos, de realização individual e coletiva.
Por tudo isto é imprescindível usar o conceito "mudança" com cautela, pois nem toda a mudança é positiva.
No caso das condições de organização e de prestação do trabalho, se submetermos as suas alterações a determinismos económicos e financeiros e a meros objetivos de lucro, desaguaremos em forte retrocesso.
O trabalho do presente e do futuro requer aos trabalhadores qualificações prévias, mas a sua efetivação também propicia novas qualificações e exigências de aprendizagem só determináveis em pleno, em contexto de trabalho.
O trabalho requer ensino, informação, comunicação, cultura; exige disponibilizar tempo e participação; reclama saúde física e equilíbrio emocional; contrapartidas materiais, e outras, justas; põe em evidência a necessidade de outras atividades, realizações e lazer; potência o uso mais equilibrado do nosso tempo de não trabalho. O trabalho deve dignificar-nos e responsabilizar-nos, para que além de trabalhadores sejamos cidadãos plenos.
No atoleiro da crise e das contradições do sistema capitalista em que vivemos, a busca de saídas que concretizem uma sociedade desenvolvida e de progresso social e humano coloca-nos desafios prementes para que o futuro do trabalho chegue bem: i) há que travar uma forte batalha para recentrar o significado e o papel da economia, bem como o conceito de emprego, associando-o à valorização e responsabilização pelo trabalho enquanto atividade de produção de bens úteis ao desenvolvimento equilibrado da sociedade; ii) forçar a utilização de uma parte da riqueza existente, concentrada de forma egoísta na posse de alguns, para criar milhões e milhões de postos de trabalho úteis e valorizáveis; iii) articular a inovação tecnológica com a inovação social, valorizando está muito mais, utilizando de forma mais racional e justa os conhecimentos; iv) forçar um grande combate por uma nova operacionalização do valor do trabalho, o que desafia a não se deitar para o caixote do lixo a importância das trajetórias e carreiras profissionais, a colocar na ordem do dia a valorização do salário e do tempo de trabalho, a equilibrar o individual e o coletivo, a trabalhar bem a igualdade, a desconstruir e reconstruir conceitos como o mérito ou a motivação.
Quando me perguntam quais os aspetos mais críticos da "gestão das pessoas" no atual contexto, inclinome para dizer que são as instabilidades e as inseguranças - para os trabalhadores em particular, mas também para as estratégias empresariais -, a aniquilação das identidades no espaço de trabalho e a ausência de uma matriz de desenvolvimento para o país.
Hoje, grande parte das empresas portuguesas, organizações científicas e os próprios serviços públicos, está prisioneira da sobrevivência e sem modelos de organização e gestão articulados e estabilizados. Esses problemas, assim como os inerentes a uma boa prestação das funções do Estado, não se resolvem com trabalho desregulado e despido de direitos.
O futuro do trabalho há de ser construído com novos rumos de desenvolvimento e com democracia.
Este foi o pertinente titulo de um debate em que participei no passado dia 30/01, organizado pelo CEGOC no âmbito do seu 50.º aniversário.
Artigo de Manuel Carvalho da Silva no JN de 02 de Fev.2013
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