O Centro de Formação e Tempos Livres e a
Base-Frente Unitária de Trabalhadores organizaram de 19 a 21 de Outubro de
2017, na Costa da Caparica, um seminário internacional sobre o tema “Por uma
Europa Social e dos Cidadãos”. A organização do seminário teve o apoio do EZA –
Centro Europeu para os Assuntos do Trabalhadores e da Comissão Europeia. O
evento juntou mais de 60 participantes, de organizações de mais de uma dezena
de países da União Europeia[1].
Importa notar a elevada participação de todos os presentes e a riqueza das
comunicações apresentadas e dos debates que se efectuaram.
Os participantes tiveram também a
oportunidade de visitar a Assembleia da República, presenciar o debate
parlamentar que decorria. Nesta ocasião, representantes da BASE-FUT, do CFTL e
do EZA foram recebidos em audiência pela deputada Wanda Guimarães,
Vice-Presidente da Comissão de Trabalho e Segurança Social. Foram apresentados
os objetivos do seminário e foi deixado o compromisso de enviar as ideias chave
do mesmo.
Em 1994, o primeiro seminário internacional
organizado pelo CFTL e a BASE-FUT teve como tema “A Europa Social dos anos 90”
num contexto de grandes transformações políticas e económicas no espaço
europeu. Passados mais de 20 anos, considerou-se pertinente regressar a este
debate numa altura em que a União Europeia se encontra numa situação de novos
desafios sociais e institucionais (a ruptura com a austeridade, reformas institucionais,
Brexit, acolhimento de refugiados, crescimento de novos nacionalismos).
Dois caminhos para A União Europeia!
A nova Declaração de Roma de 2017 propõe um reforço dos compromissos sociais europeus, nomeadamente legislação no domínio social que proteja de uma forma mais eficaz os trabalhadores e os desempregados. A encruzilhada em que nos encontramos apresenta dois caminhos: o da convergência para os mínimos sociais e o da harmonização no progresso. No primeiro caso, continuamos na via do retrocesso com a degradação das condições de trabalho, dos direitos conquistados, e da fragilização do diálogo social e da própria
Neste caso, poderá vir a ser a desagregação do projeto europeu com a exacerbação do dumping social e uma procura da competitividade à custa da coesão social.
O outro caminho, o da solidariedade e da união,
necessita de repensar a arquitetura das instituições europeias de forma a
aproximar a Europa dos cidadãos, submeter a economia ao bem comum e colocar a
pessoa humana no centro das políticas. Os objectivos e indicadores sociais
devem ter a mesma dignidade institucional que é hoje dada aos objetivos e
indicadores económicos e financeiros. Trata-se de um regresso aos fundamentos e
valores do projeto europeu: uma união baseada na solidariedade e na perspectiva
de progresso social para todos. Neste caso, as políticas de coesão – emprego
digno, proteção social, justiça social, combate a precariedade e desigualdades
sociais – podem elas próprias serem fatores de competitividade.
Qual o Sentido das reformas laborais?
O tema do Trabalho foi transversal aos diferentes painéis. Esta questão vai para além do emprego e a discussão deve abranger todas as suas vertentes, nomeadamente o desemprego, a precariedade, os desequilíbrios nas relações entre trabalho e capital, o valor e o sentido do trabalho na sociedade. As mudanças introduzidas com a generalização das novas tecnologias – uberização, robotização, diluição das fronteiras entre vida profissional e pessoal e familiar – fragilizaram o estatuto dos trabalhadores. A generalização de vínculos precários e a quase inexistência de uma carreira profissional para as novas gerações colocam em questão a identidade, a motivação e as perspectivas para a futuro do trabalhador.
As reformas laborais devem permitir uma melhor
igualdade de género com direito a uma conciliação da vida familiar com o
trabalho. A diminuição do horário de trabalho e o direito à desconexão devem
permitir uma reapropriação da gestão do tempo por parte do trabalhador.
Importa ainda definir as responsabilidades que
cabem aos Estados nesta nova arquitectura da Europa social. A preservação do
Estado-Providência, mais necessário do que nunca, coloca questões aos modelos
de proteção social, de saúde e de educação. É imprescindível o reforço de políticas europeias de regulação da
atividade económica e a construção de uma via de harmonização fiscal que
permita uma melhor redistribuição da riqueza e um investimento nos serviços
públicos. Por sua vez, as empresas também devem ter responsabilidade social
perante o Estado e os trabalhadores.
Imigrantes representam uma oportunidade e não uma ameaça!
O tema das migrações foi destacado ao longo do
seminário e coloca desafios novos para a União Europeia. Estas migrações devem
ser vistas de maneira abragente tendo em conta a imigração de populações vindas
de fora do espaço europeu, assim como também as migrações internas entre países
do centro e da periferia na União Europeia. Importa desmistificar algumas
ideias veiculadas por discursos políticos e pela comunicação social que visam
provocar medos, favorecendo o desenvolvimento de movimentos xenófobos.
As migrações representam oportunidades para a
União Europeia no âmbito da crise demográfica que coloca em causa a
sustentabilidade da economia e dos sistemas de proteção social. Acresce-se
ainda os contributos que os migrantes podem trazer ao nível da diversidade
cultural. Importa então desenvolver mecanismos de integração e de não
discriminação, de extensão do direito do trabalho e da cidadania. A luta contra
a exploração dos migrantes e o combate as redes de tráfico humano devem ser uma
prioridade. A questão do acolhimento de refugiados coloca-se num outro plano, o
do humanismo.
Desafios para as organizações de trabalhadores
Perante estes desafios, as organizações de
trabalhadores têm um papel importante a desempenhar para construir novas
respostas para abrir um novo capítulo da construção da Europa Social. Os
sindicatos, as associações e outros órgãos democráticos devem ter um papel
importante na vida dos trabalhadores, permitindo a sua participação e
desenvolvimento cultural e pessoal. Estas organizações devem ser uma ferramenta
para educar para a democracia, para uma
cidadania europeia activa. A mobilização dos trabalhadores é a única via para
evitar a erosão da Europa Social, da degradação da democracia europeia e da
subalternização dos sindicatos no Diálogo Social.
[1] Espanha, Alemanha, Itália, Áustria, Bélgica, Dinamarca, França,
Holanda, Lituânia, Luxemburgo, Polónia, Roménia e Portugal.