PODER LOCAL E CIDADANIA! (II)

PARTICIPAÇÃO DOS CIDADÃOS:


Indo ao tema proposto pelo debate, depois das bandeiras enroladas, contados os votos, aplaudidos os vencedores o que fica de participação ao povo?

Bem o povo participa na escolha e supõe-se que antes participe no debate sobre as propostas de cada um… Por aqui só o Jornal do Seixal promoveu 12 debates em 2009.

Depois das Eleições:

- A maioria das pessoas talvez não saiba que das reuniões de executivo de Câmara, há sempre duas por mês que por força da lei são públicas e que nestas há um período de intervenção do público, onde os munícipes podem colocar todo o tipo de questões.

- Nas das Juntas de Freguesia, também uma por mês tem de ser pública, onde os fregueses podem assistir e participar, num ponto da ordem de trabalhos.

- Na Assembleia de Freguesia, que ordinariamente se realiza uma por trimestre, é igualmente pública, há um ponto de participação do público que o regimento do órgão pode colocar no inicio no meio ou no fim da sessão.

- Na Assembleia Municipal que ordinariamente se realiza também uma sessão por trimestre, é igualmente pública, há um ponto de participação do público que o regimento do órgão pode colocar no inicio no meio ou no fim. A possibilidade de participação é idêntica à da assembleia de freguesia.

Diremos que formalmente os espaços de participação não são muitos, mas que mesmo assim os cidadãos participam muito pouco.

São vários os factores que levam a essa situação:

-Ausência de conhecimento, dessa possibilidade. Motivada quer por alheamento dos cidadãos à vida políti-ca, quer por pouco interesse da parte dos eleitos e pouca divulgação das sessões.

-Má pedagogia na condução dos trabalhos quando se está na presença de populares. Nas sessões com muita participação popular, os eleitos tendem a exibir de forma exagerada as suas intervenções e as sessões acabam por se tornar muito extensas e com pouco interesse.

- As sessões públicas, sobretudo nas Assembleias Municipais e de freguesia, são com frequência invadidas por um grande rol de assuntos laterais para a vida local (por vezes dezenas de saudações e moções sobre assuntos muito variados e fora do interesse local).

- Noutras o regimento prevê que o publico apenas possa intervir no fim, o que muitas vezes acontece só a altas horas da madrugada.

Bons Exemplos:

Apesar destes constrangimentos formais, Já assisti a assembleias quer municipais quer de freguesia muito vivamente participadas pela população e com consequências muito decisivas na resolução de muitos assuntos:

- Assembleias descentralizadas, com ordens de trabalhos mais direccionadas para localidade onde decorrem e com uma boa divulgação prévia.

-Assembleias onde o espaço do público ou o assunto de mais interesse para o publico presente é colocado em primeiro lugar.

-Assembleias onde são chamados técnicos ou agentes locais para introduzir um tema e o colocam ao debate da população.

-Assembleias extraordinárias temáticas para discutir, planos estruturais (viários, de urbanismo, de transporte, de turismo etc.) com uma adequada divulgação prévia.

Claro que estes aspectos são quase sempre também condicionados pela correlação de forças dos partidos na assembleia, a orientação política da mesa para um certo assunto e o interesse que o assunto tenha para a população. Tendo claro que os dirigentes autárquicos sabem muito bem como e o que devem fazer para atrair ou não atrair (afastar) os cidadãos da participação na actividade autárquica. São poucos os que levam promessas de maior participação no programa e as cumprem a seguir. Também são menos penalizados se não cumprirem a premissa de participação do que se não fizerem a obra prometida.

Regra geral nas autarquias, valoriza-se mais a obra do que a democracia e os governantes tendem a tornar-se autocráticos e deixar obra feita… (há muitos exemplos).

Porém há quem afirme que isso vai deixar de ser assim e o tempo de os autarcas deixarem uma grande obra como seus mausoléus está a acabar. De facto os recursos (do betão) vão ser progressivamente menores e os autarcas vão precisar de diferenciar por outros meios onde a abertura à participação pode ser um deles. Dar a voz ao povo pode ser até em alguns casos ser uma forma de se ficar mais aliviado. Por exemplo Macário Correia fez um referendo local para se decidir sobre a demolição de um depósito de água com fontanário e requalificação do espaço, em Tavira.



ORÇAMENTO PARTICIPATIVO

O pioneirismo desta experiência foi feito na prefeitura de Porto Alegre no Brasil e o resultado foi de tal forma inovador que se tornou objecto de vários estudos sociológicos, serviu de base a muitos trabalhos académicos e Porto Alegre tornou-se até de local de visita de gestores públicos, professores universitários e sociólogos sobretudo dos países nórdicos, para apreciar as obras saídas da decisão popular.

Em Portugal o concelho que inicialmente mais se destacou terá sido por ventura o de Palmela, mas depois muitos outros sobretudo se lhe seguiram, já vi vários exemplos sobre esta experiência alguns até bastante caricatos.

Grosso modo o conceito de “orçamento participativo” obedece a uma auscultação da população a quando de elaboração do Orçamento Municipal, sobre a aplicação de uma determinada verba do orçamento decidida pelos munícipes. Ora muitas vezes essa verba anda em menos de 0,5%, do orçamento geral do município. Há vários modelos, mas o mais frequente é a criação de grupos de cidadãos que vão definindo o que deve ser feito com essa verba (por vezes escassos de 50 mil ou cem mil euros). Regra geral essa verba dá apenas para alguns abrigos passageiros em cada freguesia, algumas passadeiras, ou mais alguns contentores de lixo.

Às vezes, (e em Sesimbra já aconteceu) apesar da muita discussão sobre a prioridade para essas pequenas bem feitorias, a verba não chega a ser aplicada na totalidade, nesse ano.

Das reuniões e debates a população aponta normalmente um conjunto de carências, mas das quais a autarquia se defende dizendo que não são suas atribuições, ex: Serviços de Saúde, Escolas secundárias, Lojas do Cidadão, etc. Convertendo-se no entanto em bandeira para reivindicação ao Poder Central,

Ficam algumas dúvidas:

-Se em vez de se auscultar a população sobre o destino a dar a 0,5% do Orçamento. Orçamento Participativo não devia pressupor auscultar a população sobre o destino a dar a todo o orçamento?

-Por outro lado se para decidir sobre a prioridade de algumas passadeiras e abrigos de passageiros, a divisão de transito da autarquia, não tem meios técnicos mais avaliados para o fazer?

Claro que estas questões orçamentais são sempre complexas e os cidadãos não sabem qual a fatia do orça-mento que é gasta pela máquina administrativa, não são chamados a discutir a sua eficácia, bem como des-conhecem a percentagem que vai ser destinada à educação, ao desporto, à cultura, ao apoio social e às obras.

DEMOCRACIA E INTER-ACÇÃO

Uma intervenção de um sociólogo a que tive acesso recentemente referia que o poder local teve vários estados: A pré-história que foi o período a seguir ao 25 de Abril e que era o abastecimento de água, a cria-ção do saneamento e a construção de estradas; Depois a História que foi a construção de escolas, creches, espaços desportivos e culturais; e a Hera Moderna que vivemos agora e passa pela preocupação com questões ambientais e de estética -Jardins, espaços de lazer, requalificação urbana etc.

Eu acrescentaria que devíamos prosseguir a nossa Hera Moderna da comunicação e da inter-acção voltando ao inicio, no espírito da Constituição de 1976, que é aproximar o Estado dos cidadãos através do poder local, chamar as pessoas a participar através dos mecanismos já existentes e de outros que os autarcas podem criar como fonte inesgotável.

16 de Maio de 2013-05-16

Jorge Henriques Santos



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