ENCONTRO COM CARDIJN, FUNDAD0R DA J0C!

Por Vitória Pinheiro*


Estávamos na primavera de 1950.A JOC portuguesa comemorava o 15º aniversário da sua fundação.
Nessa altura era eu uma neófita no Movimento e dominava-me a expetativa de ver o o fundador da JOC, ouvi-lo e,quem sabe,talvez falar-lhe.Estes sentimentos eram partilhados por todos os jocistas que haviam sido convidados para um encontro com o padre Cardijn, convidado para vir a Portugal durante as comemorações.
Chegou enfim o momento há tanto ansiado.No santuário de Fátima, numa das salas do chamado hospital velho, o fundador da JOC, sorridente, de olhar vivo e penetrante, rompe a custo a massa de jocistas que o ovacionanvam na alegria da sua juventude e repetem a saudação que lhe era peculiar:Merci Cardijn, Merci Cardijn.
Subindo à mesa, onde se encontravam os jocistas encarregados de dirigir os trabalhos do que foi a minha primeira reunião internacional,Cardijn, sempre sorrindo, levou o dedo indicador aos lábios pedindo silêncio, no que foi por todos obedecido.
Acabada a agitação própria da chegada,agora era o trabalho a sério que ia ter lugar.Cardijn tomara o seu lugar preferido numa das extremidades da mesa.Caderno sobre os joelhos,ouvidos à escuta das realidades vividas pelos jovens trabalhadores e jovens trabalhadoras da época que eram em simultâneo traduzidas para francês, a fim de que a esse extraordinário apóstolo da juventude operária nada escapasse!
Cardijn ouvia, escrevia, acenava-nos em sinal de aprovação e assentimento a tudo quanto testemunhava ação e esforços de educação e de evangelização desenvolvidas pelos jocistas, entre e com os seus irmãos de trabalho, aonde quer que eles se encontrassem:no bairro, nas oficinas,nos quartéis, nos hospitais....
Pouco falou Cardijn!
Sentadas nas primeiras filas, impressionava-me, sobretudo, a atenção que aquele homem, de aspeto franzino, mas de expressão enérgica, que entretanto nada tinha a ver com a dureza, nos prestava, bebendo cada intervenção que rapazes e raparigas iam fazendo.
De repente, da mesa, alguém apontou na minha direção e me apresentou:«é uma jocista, telefonista nos CTT».Cardijn fita-me e diz: «entre vós nos CTT há muitas raparigas e rapazes que a esperam.Em todo o mundo os CTT são um grande campo para a «batalha apostólica»
Era a minha vez de falar,todavia a voz se me embargou...o facto de Cardijn se me ter dirigido, a mim que que há escassas semanas havia sido reconhecida no Movimento como jocista....
A reunião continuou sempre no mesmo clima de entusiasmo e seriedade que só os jovens sabem dinamizar.Todos saímos revigorados no ardor e na esperança da conquista da Juventude Trabalhadora para o ideal jocista.
A este primeiro encontro com Cardijn muitos outros se seguiram.Nessa época Lisboa era passagem obrigatória para quem viajasse da Europa para o Brasil e outros países da América Latina.
O fundador da JOC era solicitado a visitar os diferentes países da América Latina,países com uma JOC nascente em todo o seu vasto continente e sempre que o fazia passava por Lisboa.A qualquer hora do dia ou da noite,os jocistas de Lisboa da diocese de Lisboa com muitos dos seus companheiros de trabalho, acorriam ao aeroporto para saudar Cardijn, ouvi-lo e revigorar o seu ardor e entusiasmo que irradiavam dos seus gestos mais do que das palavras,daquele apóstolo-gigante, que atravessava os ares na sua missão de profeta do nosso tempo.
Mas foi em 1955, também numa outra primavera, que o meu encontro com Cardijn permitiu que melhor compreendesse o que era a JOC, o que ela era e deveria ser para a Juventude Trabalhadora de todo o mundo.Mais de uma hora durou esse encontro.
Eu assumira meses antes a presidência nacional da J0C Feminina-na época havia dois movimentos, JOC para  os rapazes e JOCF para as raparigas.A J0C/J0CF realizava o seu 1º Congresso Nacional e vinham sendo alvo de uma terrível campanha orquestrada pelo regime fascista que então dominava em Portugal.
As preocupações que nos atormentavam eram enormes e os jocistas mais diretamente responsáveis por animar os Movimentos receavam não ser capazes de resistir às pressões e ciladas que forças adversas lhes criavam.
Não seria aconselhável que a JOC se unisse aos ex jocistas, já então adultos para poderem enfrentar com mais segurança o futuro?Eis a hipótese que submeti à reflexão de Cardijn e que este energicamente repudiava.Com força de uma convicção inabalável me afirmou:«Nunca»-e continuou:«a J0C faz-se com o que há».
«Se hoje há uma geração de jovens menos dotada, logo outra geração de jovens surgirá mais apta e decidida.Mas atenção, cada geração de jovens é sempre portadora duma mensagem renovadora do mundo.Da mensagem que o bom Deus confia a cada ser humano.É essa mensagem que a JOC tem de saber captar de cada jovem trabalhador e de cada jovem trabalhadora.É essa mensagem que a J0C tem de levar à juventude trabalhadora para consciencializar-se e pô-la em prática para a construção do mundo novo.Dum mundo mais humano, mais cristão!É esta a missão educadora da J0C que os seus dirigentes, e sobretudo, os seus assistentes,devem realizar sem descanso!»
Este é o meu grande encontro com Cardijn!Num pequeno lapso de tempo revia a minha prática no Movimento e receonhecia pela experiência pessoal e coletiva desses últimos cinco anos da minha vida o quento devia à J0C na descoberta da minha missão no mundo!
Uma vez mais terminava esse inesquecível encontro com a coragem renovada mas sobretudo com a certeza de que os/as militantes jocistas, na simplicidade das suas vidas, no ardor da sua fé em Jesus Cristo eram o feremento indispensável que havia de levar a vasta massa de jovens trabalhadores que em Portugal como nos restantes países do mundo aonde a J0C era já uma presença levantavam os alicerces duma sociedade aonde a mensagem libertadora de Jesus Cristo era já querida e sinceramente vivida.
Para Cardijn não havia uma J0C fraca e uma J0C forte!Para Cardijn havia uma J0C à medida dos jovens que a faziam!Feita por eles, com eles e para eles, a J0C tem a garantia de estar à medida das suas próprias capacidades.

*Testemunho publicado no «Diário de Notícias»-Lisboa, de 7 de outubro de 1982.

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